Nesta crônica, apresento-lhe Seu Minelli, vítima da invasão cotidiana de palavras estrangeiras em nosso idioma pátrio.
Quando digo “muitos de nós”, refiro-me àqueles de meia-idade, pouco habituados ao mundo cibernético, ainda tateando ou procurando adaptar ao mundo dos mais jovens, hábeis internautas, muitos desses termos até enfeiam e agridem nosso já tão maltratado idioma pátrio: o Português.
Isso, a bem da verdade, não constitui coisa nova. Há muito, nossa língua vem sendo invadida por termos estrangeiros, fruto de traduções que não encontram similares ou por mero modismo. Entendo também que muitas dessas palavras enriquecem o Português, outras... tenho minhas dúvidas.
Quando bancário, havia uma expressão que usávamos rotineiramente sem saber (pelo menos eu) de que se tratava de uma tradução livre do inglês: Correio Eletrônico, tipo de mensagem enviada para a rede de agência do banco, que nada mais é senão o tão conhecido e trocado E-Mail (Eletronic Mail).
E por falar em e-mail, muitos já tentam adaptá-lo a nossa pronúncia e grafia, preferindo escrever “emeio”. Se vai vingar, o futuro é quem vai dizer. A despeito dele, desse tal e-mail, já tão difundido, meu pai me perguntou, certa vez, quando assistia a um jogo na TV:
— Novais, o que é e-mail, que eu vejo na revista, no jornal e aqui na televisão?
Vale registrar que ele pronunciou e-mail como se fosse uma palavra oxítona, isto é, com a sílaba tônica no “il”, e fortemente pronunciada — “e-ma-íl” — como é do seu jeito.
Foto: Reprodução / Facebook. 2019. |
Pois bem, esta mesma invasão que chamei alienígena, fez-me vítima várias vezes, em sala de aula, quando pronunciei “erradamente” “firestóne” em lugar de “fáirestone”; “licra” em vez de “laicra”. E por aí vai. E olhe que aspeei o termo “erradamente”, logo no início, para justificar que não sou obrigado a pronunciar “corretamente” palavras de outro idioma. Mas quem perdoa? Quem não quer tirar sarro? Fazer uma gozação? Portanto, é melhor ter certa prudência.
E foi justamente isso — prudência — o que não teve Seu Minelli: cidadão de meia-idade, sempre risonho, amigo, que aceita com bom humor as brincadeiras, um sujeito bonachão, engraçado, um tipo zen, um bon vivant.
Seu Minelli inventou de continuar os estudos. Já tem dois cursos de nível superior, mas resolveu fazer um novo curso universitário, Urbanismo. Não gosta de ficar parado a cuidar de netos, fazer compras em shoppings. Isso não. Ele gosta é de estudar, futucar a Internet, WhatsApp, celular de última geração... Isso é com ele.
E assim, facilmente, adaptou-se aos novos costumes, às gírias e aos linguajares dos jovens colegas. Ele, o coroa da sala, já se sentia muito à vontade, enturmado. Brincava com todos e todos o respeitavam, tratavam-no — inclusive os professores — de “Seu Minelli”, com toda a deferência que seus loiros e grisalhos cabelos poderiam insinuar (ou exigir).
Início de mais um semestre letivo. Seu Minelli, sentado na primeira fila, bronzeado, compenetrado, pois não havia feito prova final — passou direito em tudo —, tinha o respeito da turma e a mestra sabia disso, por isso mesmo sempre a ele se dirigia:
— Seu Minelli, anote aí o e-mail da turma e a senha, para que todos tenham acesso, quando quiserem mandar alguma mensagem para mim, tirar alguma dúvida...
— Mandaí, pró. Já demorô — todo solto, cheio de gíria e intimidade.
— Anote, então: urbanismo underline matutino arroba uneb ponto bê-erre.
— Pró, quem é esta colega que eu não conheço ainda?
— Que colega, Seu Minelli, que o senhor não conhece ainda?
— Essa tal de Anderlaine que a senhora acabou de falar.
A mestra tentou explicar para Seu Minelli o que é underline, mas não conseguiu devido aos incontroláveis risos da turma. Tentou dizer-lhe que a “anderlaine” (underline) por ele referida significa “sublinha ou linha abaixo”, que é aquele velho tracinho posto abaixo das letras que as antigas máquinas de datilografia já traziam, a fim de destacar uma palavra, uma frase; é o grifo de idos tempos, já que nas máquinas não havia como negritar.
Foto: Novais Neto. 2019. |
A turma estava em êxtase, era unissonante gargalhada, inclusive da contida professora. E ele, que também sorriu à beça da terrível mancada, não foi perdoado pelos colegas e passou a ser tratado doravante, bem carinhosamente, por Seu Minelli de Anderlaine. Muito chique, não é mesmo, Seu Minelli? Aliás, Minelli de Anderlaine!
Para seu consolo, Seu Minelli, se isso serve, o senhor não está errado, Anderlaine existe sim e não é somente uma. Depois de fazer umas pesquisas no Google, acabei por encontrar algumas Anderlaines, que podem ser verificadas nos sites abaixo, acessados em 25/8/2019:
Jaqueline Anderlaine da Silva, disponível em: <https://www.escavador.com/sobre/237876972/jaqueline-anderlaine-da-silva>.
Anderliza Anderlaine da Silva Ramos, disponível em:<http://www.nc.ufpr.br/concursos_externos/pmc2016/resultado_objetiva/02_todos.pdf>.
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Obs.: Perfil no Facebook de Email Suarez Barboza disponível em: <https://www.facebook.com/Email-Suarez-Barboza-73052579487/>. Acesso em: 25/8/2019.