terça-feira, 9 de julho de 2019

Carta ao seu silêncio

Num tempo transcurso, há bastante tempo, redigi esta carta ao Silêncio e obtive respostas... de quem a leu!

Indesejável Silêncio:

Por não mais suportar o constante assédio da saudade a torturar-me, diuturnamente, mais uma vez ouso quebrá-lo. Sei que você é de vidro, por isso, muito frágil.

No começo, tudo era absoluto e monótono Silêncio entre nós. Eu aceitava porque não havia conhecido seu grito. Hoje, entretanto, tudo retorna ao princípio porque você resolveu calar-se, deixando-me abominável presente de grego: você mesmo, o Silêncio.

E assim, em completo Silêncio, fico a questionar algo que para você é inquestionável: permanecer em Silêncio enquanto seu ego alimentar de forma suave e prazerosa o desejo de vingança. Lembre-se, porém, que a vingança é o mais efêmero dos prazeres. Se é que se pode admitir que seja um prazer.

O Silêncio, por sua vez, é ausência que traz o desespero e sufoca o grito. O mesmo grito que tiraria de latência meu eco encarcerado. Um eco que não existiria sem um antecedente alarido que se fizesse uma “quebra de Silêncio”.

Diz-se — com matemática precisão — que “quem cala, consente”. Calar? Por quê? Se não aceito seu Silêncio? Quem sabe se esse Silêncio não seja a prova definitiva, cabal, de que nem mesmo você sabe explicá-lo. Ou, se é que sabe, quer enlouquecer-me em Silêncio.

Não. Não mesmo! Você não vai conseguir me tresloucar, descentralizar-me, ainda que meus ouvidos ouçam tão somente: Silêncio... Silêncio... Silêncio. Porque você só quer emitir Silêncio... Si-lên-cio...

Por fim, diante do melancólico Silêncio que me obriga a ouvir, despeço-me, Silenciosamente, convicto de que, doravante, ouvirá como resposta minha os ecos do meu (temporário?!) Silêncio.

Até...


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Obs.: Crônica publicada no Recanto das Letras em 2/5/2010. Disponível em:<https://www.recantodasletras.com.br/cartas/2232895>.

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